[Verso 1]
É mesmo incrível, estamos num quebra cabeça terrível
Nos jogaram na sarjeta, nos tomaram as muletas
Prosseguir parece impossível
Agora, saca só, essa história sei de cor
A coisa é muito séria
De repente pei, pum, pum mais um, já era, já era mas
De que vale a vida oprimida sem perspectiva, hein? Me explica?
Aos 20 e pouco de idade larguei a faculdade
Pra meus pai, um baque; pra mim, nenhuma novidade
Sei que errei, mas que lição tirar?
O importante é que consegui chegar
Onde muitos da minha cor querem chegar e não conseguem chegar
Ah, não seja ingênuo a ponto de imaginar
Que eu sou melhor que você ou você é um Incompetente
Pare, analise, raciocine friamente
Quantos de nós ocupam hoje altas patentes?
A pergunta é uma só, mas se fossem mais de cem certamente a resposta não seria diferente
Estamos assustadoramente ausentes
Agora invertendo a moeda
Entre os que os que morrem precocemente quantos são da cor da gente?
A pergunta é uma só novamente, mas se fossem mais de cem certamente a resposta infelizmente não seria diferente
Estamos assustadoramente presentes
Exemplos citados, já deu pra perceber de cara algo de errado
Pra ser mais claro, reflexos do passado
É, é mesmo incrível
[Verso 2]
1888: de um momento pra outro a abolição sem nos dar condição Com uma só intenção: criar um novo consumidor interno
E o negro era o estereótipo certo
Carente de educação, louco pela sua liberdade, irmão
Cenário completo para a mais nova suja e nojenta armação
Já aos 12 de idade conhecia a faculdade de verdade
Era com a rua minha identidade, com ela e suas personalidades
A maioria ancestrais daqueles a quem deram uma falsa liberdade
A prova viva do maior dos crimes da humanidade
Aos 29, uma força me move
Essa força é você que não tem o que comer e nem sabe o porquê Oh, irmão, cada vez que te humilham me arrancam um pedaço
E isso é o que pensa a molecada do riacho
Minha área, meu espaço conquistado com suor, não por acaso
Mas vamos aos fatos:
Nos tiraram a certeza, nos lançaram contra a correnteza
Instituíram padrões de beleza
Isso não se faz não, não vai ficar assim
E se depender de mim, vamos até o fim
Vamos mexer no passado mesmo que seja horrível
Vamos fazer nosso presente o melhor possível
É, é mesmo incrível
[Verso 3]
É mesmo incrível! a maneira como nos escravizaram
Até nossa auto-estima arrancaram
E muitos que deviam ser a nós aliados são implacáveis adversários Pura desinformação, maldição
Não, não, não olhem assim pra mim
Não sou diferente e te encaro de frente
Sou um cidadão preto, exigindo o direito de ser considerado gente
E o argumento que sustento pra manter a fé
E partir com todo gás pra cima vou te dizer qual é
Somos a maioria da população ativa
Sem nós essa terra não teria vida
E não há preço para essa sua dívida
Estamos a anos entrincheirados nos morros
Nas cidades do entorno são inúmeros nossos gritos de socorro Diante da incerteza, somos habitantes dos bolsões de pobreza Onde quando cai a chuva, a catástrofe também cai como uma luva Sobreviver pra ver a situação se inverter
A gente há mais de 400 anos tenta a conhecida e sofrida morte lenta
É, é mesmo incrível