Ouço ranger as rodas dentadas do devir
A esmagar os tendões do tempo
Derrubando as árvores
Estilhaçando as pedras
Aproximando as ruínas
As tempestades tumultuosas que varrem as trevas
Trazendo o ocaso de um mundo em extinção
Engalfinhando as águas
As chuvas dos céus
Deixando as nuvens cair como granizo em flor
As cidades devastadas pela veloz língua do vento
O fogo crematório saltando
Enfunado
Cheio de ventos e marés
Numa velha imagem desenhada
Pela mão venenosa de um pesadelo
Vinda do sono
Em direcção ao princípio de todas as coisas
Os músculos vencidos
O corpo retende
Sem forças
Carcomido pela doença
Vergado pela dor
O eco batendo
À procura de uma resposta
Que só a húmida terra tumular
Pode fornecer
O presente envenenado pelas nuvens da barbárie
O futuro já não é
Uma fonte de esperança
Só nos resta a indigência
Ou morrer de morte certa
Como heróis de pechisbeque
Neste grande fogaréu
De aparato e opulência
Em que farra o capital
O futuro já não é o que era
Esgotada a reserva de alento
Que transforma a vontade em metáfora do novo
E em renovação de expectativas
Tudo parece caminhar p'a pior
Sem a perspectiva de um qualquer golpe de asa
Capaz de inverter essa direcção
E com isso
Cresce a certeza de uma iminente explosão incontrolada
E de consequências imprevisíveis
E que pode significar o fim doloroso
De todas as referências
Mas também o início
De uma aventura sem par
De exaltação da vida
E da entrega incondicional
Às paixões mais arrebatadoras
E amotinadas
O presente envenenado pelas nuvens da barbárie
O futuro já não é
Uma fonte de esperança
Só nos resta a indigência
Ou morrer de morte certa
Como heróis de pechisbeque
Neste grande fogaréu
De aparato e opulência
Em que farra o capital (x2)