História de um miúdo que está a ser julgado e os reús são o pai ausente dele, a professora de primária e o patrão do primeiro trabalho dele. Ele conta a relação do miúdo com essas personagens todas e depois defende-se.
[Letra de: "Advogado do Diabo"]
[Intro]
Gaia (4400)
[Verso]
Homens matam por um carro, roubam por agrado
À cara podre querem o mais caro
Inocente ou culpado, quem julga é julgado
Em tua defesa, advogado do diabo
Cresceste rápido no sitio onde é clássico, consumo e o tráfico
A classe operária dá o máximo e não sai do básico
Queres algo prático, o sistema é sistemático
Quem 'tá bem na vida tem coração do Ártico
Navalhas e balas, mochilas e malas
São eles que te criam e não querem represálias
Discriminam-te pelo calão que falas
Leva-me contigo para as salas de sentença
E manda entrar o homem que te fez e não marcou presença
Desde a infância que hoje em dia pensa
Que não teve importância no teu crescimento
E nos processos que te acusam no teu julgamento
Fá-lo recuar atrás no tempo
Fala do momento em que burlou o cupido com o sentimento
De amor da tua mãe, por sexo gratuito
Pergunta-lhe se também se lembra disso
É que não te sai da cabeça o corpo da mulher
Que não dispensa horas extras para encher a despensa
Falta de condições que um pai ausente não compensa
O desacompanhamento gera a convivência
Com as más companhias do sítio mais propício
A filhos de pais que não cumpriram com o ofício
Todo fim tem um princípio, este pode ter sido o teu início
Não te esqueças que ele tem de pagar por isso
Manda entrar agora a professora da primária
Que pelo teu aspeto te sentou na secretária
Mais longe do quadro e quando eras chamado
Vias que ela só ria a quem ia bem apresentado
Eras o miúdo do canto da sala
Que ela fazia questão em ser o burro da aula
E não se apercebia que requerias mais atenção
O tempo com o destino, a tua mãe tinha noutra profissão
Para pagar os instrumentos da tua instrução
Diz-lhe agora que não era a tua intenção
Seres o puto mais reguila, o mau exemplo da turma
Os trabalhos de casa não os fazias quase nenhuma vez
Porque vês a tua mãe desde o coiro
Chegar para lá das 9 com o corpo feito num 8
E aprendeste a ler-lhe o pensamento em vez do livro de leitura
[?] a vida dura quanto?
A matemática? Que se fodam as contas
Subtraíste o ordenado em troca pelas compras
Dividiste por dois o que na travessa encontras
E somaste os trocos para sonhar atrás das montras
A falta de passes fez com que não passes de classes
Na secundária até que bazes da escola e passes
Mais tempo nas áreas com condições precárias
Ela é culpada das tuas más habilitações literárias
Manda entrar o patrão do teu primeiro trabalho
Que por não seres licenciado não te paga um caralho
Explora-te num ambiente sem higiene e segurança
Onde acidentes diminuem a esperança média de vida
Merda de vida, devido a quem vive p'ra além
Da expectativa, sem se importar com ninguém
Só lhe interessa se tem bens encetados
Casas e carros e não investe em métodos mais avançados
E ergonómicos porque estes não são económicos
Enquanto no resto da Europa evoluí a indústria
Na competição económica, a mesma música
Abre falência, preocupações deles é única
Se a família do patrão assegura a geração
Então as 50 ou 100 que estão no desemprego
Terão que ter paciência, todos os dias o mesmo
Anos de experiência são algo obsoleto
P'ra quê ter um trabalho honesto se o estado não motiva?
Patrão tem um Mercedes, tu deves na mercearia
Os ordenados são menores p'a quem tem gasto de energia
Trabalha com posições impróprias, toda la vida
Em ambientes poluídos gastam reformas em farmácias
Têm problemas cancerígenos, ele é o culpado por tu seguires
O sentido, não te pagou o que devia, mas fá-lo pagar contigo
Se comprares um topo de gama
Vais ter ao teu lado uma granda dama
Se baixares a capota ao passar na zona
Elas vão baixar as calças, não vai faltar cona
Se comprares a roupa do crocodilo
Todo o porteiro vai sentir o estilo
Vais entrar na discoteca sem problema
Eles fazem-te querer que tu não és a mesma
Pessoa sem bens materiais, manda entrar esses tais
Genes persuasivos com campanhas comerciais
E compostas discriminações sociais
São eles que fazem com que um homem num carro
Seja mais bonito
Com que só quem tem um vestido entre num certo sítio
Como tu se não fores como eles te sintas constrangido
De olhos como pobres e os olhos como ricos
São eles que te fazem sentir tudo isso
Com que miúdas não te prestem atenção
Enquanto não passares na zona a bombar som
Dentro do carro mais caro do mercado e que és o rei do gado
Se entrares nas lojas e vestires como o Ronaldo
Fazem-te sentir vergonha e ser menino de abraço
E os filhos deles não podem brincar com os da tua raça
Valores interiores são tretas p'a eles
Pessoas valem por quantias de etiquetas
Não percas a postura de menino do bairro
Olha-o nos olhos e fá-los sentir o que é pagar caro
Agora vira-te para esse magistrado
E diz-lhe assim: "Escute, meu caro
Não olhe desse jeito p'a mim
Vossa excelência nunca quis este fim
'Tar aqui sentado a ser acusado de ter traficado
E de ter roubado
Você não sabe o quanto é complicado
Ver uma mãe dar o máximo com o ordenado mínimo
Não ter quem me educasse para ter um comportamento exímio
Ser posto de lado como se não fosse digno
De desfrutar da vossa estrutura de ensino
Não sabe o que é ser gozado pela sua aparência
Nem o que é só ser respeitado se recorrer a violência
O que é dar o corpo num posto de emprego
Para chegar ao fim do contrato e 'tar tudo no mesmo sítio
Diga-me, se você sabe o que é que é isso
Entrar numa loja a ser acompanhado desde o inicio
Estar à porta de uma discoteca e não ter entrado
Somos todos iguais, então porque é que põem de lado?
Se é o interior que conta, porque é que filhas como a sua
Só me riram quando me viram num bom carro a passar na rua?
Tem fotos minhas a vender produto no bairro
Porque é que também não tinham quando eu era puto num quarto
A brincar com bonecos todos partidos
A tentar perceber porque é que não era como os meus amigos
Em vez de estar a ler o meu currículo
Diz a professora que mal me ensinou antes do ciclo
Em vez de 'tar a contar os anos de pena que o vosso sistema legislou
Me visse a contar trocos que o meu patrão me pagou
Em vez de perguntar que fazia branca na mesa
Pergunte-me o que sentia quando não tinha nada na mesma
Pergunta: porque é que a garagem tem matrículas?
Pergunte: porque é que após o 9º não tenho mais matrículas?
Pergunta: Se eu matei alguém com tec-9's
Pergunto: Como é que eu quase morri nos andaimes?
Para si, isso não lhe interessa, é
Por isso todos os dias a mesma conversa, é
Os putos da periferia a fazer porcaria, eu também preferia
Não ter seguido a simetria
Mas assim teria que me sentir à parte da minoria
Que o vosso sistema cria
Parte da maioria suburbana
É movida pela primazia humana, dinheiro luxo e fama
Que atrai drama
Atribua-me a pena, não tenha pena de mim
Dê-me a sentença que o sistema tem como certa p'ra mim
Que eu cumpro até ao fim, que assim seja
Mas faça pagar quem fez com que, assim seja
Porque enquanto houver altos e baixos
Putos vão vender hax e achar os carros
Mais suscetíveis para serem desmontados
Até crescerem e ouvirem noutros lados
Carrinhas de valores e branca com tanta e tanta
Gente vai querer ter o que não precisa
O vosso sistema cria marginais, ao fim ao cabo
Porque nos marginaliza
Inocente ou culpado, quem julga ou é julgado
Em tua defesa, advogado do diabo
(Em tua defesa, advogado do diabo)
Advogado do Diabo was written by Deau.
Advogado do Diabo was produced by DJ D-One.
Deau released Advogado do Diabo on Tue Nov 01 2011.